Universidade Federal do Rio Grande do Norte intensifica ações de acessibilidade para universitários com Transtorno do Espectro Autista, que enfrentam desafios sensoriais, comunicativos e estruturais no ambiente acadêmico
Estímulos sensoriais, dificuldades de comunicação e desafios de organização são alguns dos obstáculos enfrentados diariamente por estudantes com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no ambiente acadêmico. Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o número de alunos com TEA que buscam apoio institucional cresceu expressivamente nos últimos anos. Dados da Secretaria de Inclusão e Acessibilidade (SIA) revelam que, entre 2014 e 2024, os pedidos passaram de 5 para 101, totalizando 259 solicitações em 11 anos.
A demanda crescente está associada, segundo especialistas, a fatores como o aumento no número de diagnósticos, a maior conscientização pública sobre o autismo e a implementação de políticas inclusivas. “É possível apontar o avanço na conscientização pública, a ampliação do diagnóstico precoce e a implementação de políticas públicas como principais fatores”, explica a professora Débora Nunes, do Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação da UFRN.

A assistência da SIA é oferecida de forma personalizada, considerando as necessidades específicas de cada estudante. O processo começa com o registro do pedido no Portal do Discente do Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (Sigaa). Em seguida, uma profissional da SIA realiza avaliação individual e emite um documento com orientações didático-pedagógicas a ser compartilhado com os docentes das disciplinas cursadas pelo aluno.
Ações práticas no ambiente universitário
Helena Xavier, estudante de Psicologia e membro do Coletivo Neurodivergente da UFRN, relata que conta com o apoio da SIA desde o segundo ano do curso. Entre as adaptações concedidas, estão a realização de provas em ambientes tranquilos e o recebimento de materiais de forma acessível.
A professora Débora Nunes destaca que os principais desafios enfrentados pelos estudantes com TEA incluem dificuldades com ruídos, iluminação intensa e aglomerações. Além disso, há limitações na compreensão de textos figurativos e abstratos, produção escrita e gestão do tempo. “Frequentemente, esses estudantes apresentam formas particulares de processamento sensorial, o que pode acarretar dificuldades significativas no ambiente acadêmico”, afirma a docente.

A estudante Helena relata que as dificuldades começam ainda no trajeto até a universidade, devido aos estímulos sensoriais enfrentados no deslocamento. “A gente já chega na universidade muito cansado”, relata.
Conscientização e formação docente
Além das barreiras sensoriais, a falta de compreensão da comunidade universitária sobre as necessidades de pessoas autistas é um entrave para a inclusão. “Quando a gente pede para desligar uma luz ou para falar mais baixo, as pessoas, às vezes, não compreendem”, relata Helena. Ela defende que os próprios autistas devem ser ouvidos em discussões sobre acessibilidade. “Somos nós quem sabemos da nossa vivência e como é viver num mundo sendo autista”, destaca.
A SIA atua com recomendações específicas para os docentes via Sigaa, sugerindo, por exemplo, ampliação do tempo de prova, disponibilização prévia de conteúdos e adequação do ambiente de sala de aula. A neuropsicóloga Danielle Garcia, integrante da equipe da SIA, afirma que a identificação das necessidades dos estudantes é fundamental para o direcionamento das ações de apoio. “Uma vez que são identificados, eles passam a ser foco das políticas e das ações da universidade”, explica.
Coletivo Neurodivergente e apoio entre pares
Além do suporte institucional, os próprios estudantes organizam-se por meio do Coletivo Neurodivergente, antes chamado de Coletivo Autista. O grupo inclui pessoas com TEA, TDAH, dislexia e discalculia. As ações incluem debates, compartilhamento de experiências em grupo de WhatsApp e encontros presenciais. O objetivo é discutir os desafios enfrentados no meio acadêmico e buscar soluções colaborativas.
Interessados em participar do coletivo podem preencher um formulário online disponibilizado pelos membros do grupo.
Compromisso institucional
As ações da SIA estão alinhadas ao Plano de Gestão 2023–2027 da UFRN, que prevê no Indicador 22 o fortalecimento das Comissões Permanentes de Inclusão e Acessibilidade (CPIAs). Essas comissões são responsáveis por promover mecanismos institucionais de inclusão, garantindo a integração plena de estudantes com necessidades educacionais específicas.
A professora Débora reforça que a formação contínua de professores e a conscientização da comunidade acadêmica são passos essenciais para a construção de um ambiente mais acessível. Para Helena, é necessário também fomentar o diálogo entre alunos neurodivergentes e neurotípicos. “É também, por parte dos alunos, entender que a gente não é um bicho, que vocês podem chegar e conversar”, declara.
Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN / Matheus Trilico
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