Deputado apresenta projeto de lei para reduzir impactos socioambientais das energias renováveis no Brasil

Deputado apresenta projeto de lei para reduzir impactos socioambientais das energias renováveis no Brasil

Iniciativa do deputado federal Fernando Mineiro (PT-RN) define regras para o licenciamento de parques eólicos e solares

O Rio Grande do Norte é o segundo estado brasileiro com maior capacidade de geração de eletricidade a partir da força dos ventos, perdendo apenas para a Bahia. São 10.098.836 kW distribuídos entre 376 empreendimentos, o correspondente a 30,4% de todas as outorgas concedidas no País pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Para que a energia eólica potiguar continue em ascensão, mas com menos impactos sociais e ambientais, o deputado Fernando Mineiro (PT-RN) apresentou no Congresso Nacional o Projeto de Lei 4386/2024.

Entre as soluções da proposta de lei é que o Código Civil passe a reger os contratos de arrendamento de terras para os empreendimentos. “Essa vinculação é essencial para que os arrendamentos rurais para geração de energia eólica ou fotovoltaica resguardem todas as garantias e direitos da legislação aos proprietários ou posseiros das áreas onde serão instalados os equipamentos”, esclarece o parlamentar. Atualmente a maioria dos contratos de renováveis é amparada na equivalência com os de arrendamento para uso rural, mesmo não se tratando de atividade agrícola, pecuária, agroindustrial ou extrativista.

Durante duas décadas, o sigilo contratual escondeu cláusulas abusivas em arrendamentos de pequenas propriedades do Nordeste para instalação de centrais de energia renovável. As irregularidades, que vieram à tona em 2023 a partir de um estudo do Inesc em parceria com a iniciativa Plano Nordeste Potência, vão desde valores irrisórios pagos por hectare até a falta de acesso à energia mais barata, passando pelo embaraço na aposentadoria rural e responsabilização do proprietário, não do arrendatário, pela sucata deixada pelos empreendimentos no futuro.

Enquanto as centrais de geração de energia renovável se multiplicam (em 2024, ano em que mais se instalaram usinas elétricas no Brasil, 51,87% delas foram fotovoltaicas e 39,26%, eólicas, segundo dados da Aneel), os problemas socioambientais se agravam. “Os contratos de arrendamento rural praticados atualmente pelo setor de renováveis contêm cláusulas jurídicas aviltantes, que contribuem para acentuar desigualdades e a concentração da renda, principalmente nas áreas mais desassistidas do País”, analisa Fernando Mineiro.

A proposta do parlamentar inclui ainda um tema recorrente: a exigência de Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) dos empreendimentos de energia solar e eólica. O artigo 17 do PL determina que “é exigida a apresentação do EIA/Rima para todo e qualquer empreendimento de geração centralizada de fonte eólica, com potência instalada conjunta acima de 3 MW (três megawatts) e garantida a consulta pública prévia aos estudos de licenciamento e das ações de mitigação de impactos causados pelo empreendimento.”

Um dos documentos que fundamentaram a elaboração do PL 4386/2024 foi o Salvaguardas Socioambientais para Energia Renovável. Elaborado pela sociedade civil, com apoio do Plano Nordeste Potência, o documento propõe mais de 100 medidas para reduzir impactos socioambientais de parques eólicos. Lançado nacionalmente em janeiro de 2024, foi em seguida apresentado a órgãos governamentais, políticos e juristas dos estados do Nordeste.

Integrante da equipe de elaboração das Salvaguardas e um dos articuladores no Rio Grande do Norte, João Paulo dos Santos Diogo, do Coletivo Assessoria Cirandas, considera o PL 4386/2024 uma vitória significativa para as comunidades tradicionais e para as populações atingidas pelos impactos das energias renováveis, especialmente no Nordeste, onde os impactos dos empreendimentos de energia renovável têm sido sentidos de forma desproporcional.

“Essa proposta legislativa não só reconhece a necessidade de proteger os direitos territoriais e culturais, mas também cria condições para que a transição energética seja mais justa e sustentável”, diz o assistente social e especialista em Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Na opinião de João Paulo, o PL propõe diretrizes que vão além da mitigação de impactos, estimulando a construção de um ecossistema de produção energética mais equilibrado. “A regulação de contratos de arrendamento, com a proibição de cláusulas abusivas e a garantia de renegociação, é um passo fundamental para impedir o apoderamento territorial e promover relações mais justas entre empreendedores e proprietários rurais. Essas medidas podem criar um ambiente onde a geração de energia renovável se torne uma oportunidade de desenvolvimento inclusivo, beneficiando diretamente as comunidades envolvidas”, analisa.

Tramitação

Depois de apresentado, o projeto de lei vai tramitar nas Comissões Temáticas da Câmara dos Deputados e, uma vez debatido e aprovado, será submetido à votação no Plenário da Casa.

Atualmente o PL 4386/2024 aguarda designação de relator(a) na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural. Posteriormente também será analisado nas comissões de Constituição e Justiça e de Cidadania, de Minas e Energia, e na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável antes de ser votado em plenário.

“Nossa expectativa é de rápida tramitação, em função do reconhecimento da importância, relevância e urgência do tema. Esse PL se insere na luta contra o ‘apoderamento territorial’, que objetiva a cessão de terras às grandes companhias por baixo custo, amplificando o quadro histórico de vulnerabilidades socioeconômicas”, avalia o parlamentar.

Destaques

  • CONSULTA LIVRE, PRÉVIA E INFORMADA (Art. 8º e Art. 16, III):

A exigência de que as comunidades potencialmente afetadas sejam consultadas antes da emissão de outorgas é um marco essencial para assegurar o respeito aos direitos territoriais, culturais e sociais das populações tradicionais. Essa previsão está em plena consonância com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que estabelece o direito das comunidades indígenas e tradicionais de serem consultadas de forma efetiva e participativa em qualquer processo que impacte seus territórios. Essa salvaguarda fortalece os mecanismos de governança territorial e amplia o protagonismo das comunidades no diálogo sobre projetos que podem afetar diretamente seus modos de vida, garantindo uma transição energética mais inclusiva e justa.

  • REGULAÇÃO DE CONTRATOS DE ARRENDAMENTO (Art. 9º a Art. 13)

O PL avança ao estabelecer normas que protegem os direitos dos pequenos proprietários rurais, frequentemente vulneráveis a práticas abusivas por parte de grandes empresas do setor energético. A regulamentação impede cláusulas que prejudiquem os proprietários, como prazos excessivamente longos, sigilo obrigatório ou penalidades desproporcionais. Além disso, ao garantir a possibilidade de renegociação contratual, o PL reforça o equilíbrio entre as partes envolvidas, promovendo relações contratuais mais justas e respeitosas. Essa regulação contribui para evitar o apoderamento territorial e assegura que os benefícios econômicos da transição energética sejam melhor distribuídos.

  • SALVAGUARDAS AMBIENTAIS (Art. 17 a Art. 20)

O PL inova ao exigir estudos de impacto ambiental (EIA/RIMA) para empreendimentos de geração centralizada com capacidade superior a 3 MW, abordando também impactos cumulativos e sinérgicos. Além disso, a inclusão de planos de descomissionamento e recuperação de áreas degradadas demonstra o compromisso com a sustentabilidade de longo prazo, assegurando que os impactos adversos sejam adequadamente mitigados e que os territórios possam ser restaurados após o término das atividades. Essas medidas tornam o licenciamento ambiental um instrumento efetivo de controle e preservação ambiental, alinhado às melhores práticas internacionais.

  • DIRETRIZES PARA A LOCALIZAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS (Art. 18)

A adoção de cartografia social, zoneamento ecológico-econômico e outros instrumentos participativos para a definição da localização dos empreendimentos prioriza áreas de menor impacto ambiental e social. Essa abordagem não apenas promove o planejamento sustentável, mas também incorpora o conhecimento local e as demandas das comunidades. Ao integrar esses elementos ao processo de decisão, o PL reforça o papel das comunidades como agentes ativos na transição energética e contribui para minimizar os conflitos e desigualdades associados à expansão dos parques de energia renovável.

No Rio Grande do Norte há 376 usinas eólicas autorizadas a funcionar, de acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). No Nordeste, há outras 1.128. São 598 na Bahia, 174 no Piauí, 172 no Ceará, 104 na Paraíba, 60 em Pernambuco, 19 no Maranhão e 1 em Sergipe. Os números percentuais, por Estado: Bahia (32,85%), Rio Grande do Norte (30,39%), Piauí (13,23%), Ceará (7,98%), Pernambuco (3,81%), Paraíba (3,34%). Maranhão (1,28%), Sergipe (0,10%).

Fotos: Lívia de Paiva/Instituto Terramar/ Tulio Martins/Arquivo ASPTA / GOVBA / Vinícius Loures/Camara dos Deputados

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